Autos n. 0
Acusado: Jean-Paul Sartre
Meritíssimo Juiz:
Seguem anexas as contrarrazões de recurso do Ministério Público, em 8 (oito) laudas digitadas. Witmarsum, 09 de dezembro de 2019
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE WITMARSUM
Autos n. 0
Recorrente: Jean-Paul Sartre
Decisão recorrida: Sentença de pronúncia pelo art. 121, §2º, IV, c/c art. 29, ambos do Código Penal
Aleister Crowley
Promotor de Justiça
CONTRARRAZÕES DO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO
COLENDA CÂMARA CRIMINAL
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR RELATOR
EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROCURADOR DE JUSTIÇA
Perante a vara do Tribunal do Júri da Comarca da Capital, o Ministério Público, no exercício de suas atribuições, ofereceu denúncia contra Jean-Paul Sartre e outros dois acusados pela prática do delito tipificado no art. 121, §2º, IV, c/c art. 29 do Código Penal (fls. 2-4). Finda a instrução da primeira fase do rito escalonado dos processos de competência do Tribunal do Júri - o jus accusationis, o MM. Magistrado pronunciou o acusado nos exatos termos da exordial acusatória (fls. 441-452).
Intimado da decisão, o réu Jean-Paul Sartre, por meio de seu defensor, interpôs, tempestivamente, recurso em sentido estrito (fl. 465), cujas razões foram levadas a à efeito às fls. 469-471.
Em seu arrazoado, postulou a defesa a reforma da decisão para absolver sumariamente o recorrente.
Na sequência, vieram os autos para o oferecimento das contrarrazões recursais pelo Ministério Público.
É o relato necessário.
DO MÉRITO
A defesa postulou a decretação da absolvição sumária do recorrente sob o argumento de que Michel Foucault teria assumido o crime e que não há provas da participação do recorrente no fato.
Inicialmente, destaca-se que para a decretação da absolvição pretendida é necessário a prova cabal da ocorrência de uma das hipóteses previstas nos incisos do art. 415 do Código de Processo Penal, caso contrário, o caso deve ser dirimido perante o Tribunal do Júri.
Nesse sentido:
CRIME CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELA SURPRESA E PELO MOTIVO TORPE (ART. 121, § 2.º, INCS. I E IV, DO CÓDIGO PENAL). IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA PRETENDENDO A ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. FASE EM QUE VIGORA O PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. (TJSC. 2011.046596-3. Relator: Alexandre d'Ivanenko. Julgado em: 18/10/2011)
No caso dos autos, denota-se que nenhuma daqueles situações descritas estão demonstradas, tampouco aquela prevista no inciso II como quer fazer crer a defesa.
Isso porque, provada a materialidade do delito, que aliás é inconteste, conclui-se que o fato existiu e constitui uma infração penal. Por outro lado, não há nenhuma causa de isenção de pena ou de exclusão de crime. Por fim, não está provado que o recorrente não é autor ou partícipe do fato, muito pelo contrário, existem fortes indícios de sua participação no delito apurado.
Referendando o entendimento exposto, no que toca a certeza necessária a decretação da absolvição sumária, destaca-se o seguinte julgado deste Egrégio Tribunal.
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. IMPUTAÇÃO DA PRÁTICA DE TENTATIVA DE CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. PRONÚNCIA. INCONFORMISMO INTERPOSTO PELA DEFESA.ALMEJADA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA OU A IMPRONÚNCIA DO ACUSADO. ALEGAÇÃO DE NEGATIVA DE AUTORIA E RETRATAÇÃO JUDICIAL DA VÍTIMA E DAS TESTEMUNHAS OCULARES. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA ACERCA DA INOCÊNCIA DO RECORRENTE. MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA. PREVALÊNCIA DA COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL ASSEGURADA AO TRIBUNAL DO JÚRI. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.(TJSC. 2010.052776-5. Relator: Newton Varella Júnior. Julgado em: 15/03/2011)
A defesa, de forma sucinta, ressalta que há nos autos a confissão do menor Michel Foucault e, em razão, disso não haveria como pronunciar o recorrente pela prática do crime.
No entanto, como já discorrido nas derradeiras alegações apresentadas pelo Ministério Público, essa confissão não merece credibilidade, por contrariar completamente as demais provas produzidas durante a instrução processual.
Nesse sentido, a fim de evitar tautologia, colaciona-se nessa oportunidade a discussão trazida em sede de alegação finais por este Órgão de Execução (fls. 394-397). "A autoria por parte dos acusados Jean-Paul e Émile Durkheim, da mesma forma, é indubitável, possuindo suporte probatório conforme depoimentos colhidos, tanto na fase investigativa quanto na fase processual.
Ainda que durante a acareação realizada pela autoridade policial e durante a instrução processual os acusados tentem dar uma versão diferente dos fatos, impondo a responsabilidade do crime tão somente ao menor Michel Foucault, essa não é a versão encontrada no escólio probatório produzido.
Na primeira oportunidade em que foram ouvidos, os acusados Émile Durkheim (fl. 83-84), Albert Camus (fl. 97-98) e o menor Michel Foucault (fl.123), relataram exatamente como foi a execução do crime. Ainda que existam algumas divergências em suas declarações sobre quem estava dirigindo e sobre quem teria efetuado os disparos, todos foram enfáticos em afirmar que, no momento em que Yves Michaud foi morto, os três acusados estavam no caro e participaram da ação criminosa.
Os três ainda relataram, de forma uníssona, que após a morte de Yves Michaud o grupo (Jean-Paul, Albert, Émile e Michel) se deslocou para a cidade de Doutor Pedrinho, para uma ficar uns dias na casa de familiares do acusado Albert Camus.
Corroborando essa primeira versão apresentada pelos responsáveis, cumpre destacar as declarações lúcidas prestadas por Ferdinand Alquié, irmão da vítima , que presenciou toda a ação criminosa.Nas duas vezes em que foi ouvido na fase policial a testemunha relatou ter visto o acusado Jean-Paul Sartre descer do caro e efetuar os disparos contra seu irmão.
[...] Que dias depois do acontecido, jã mais calmo, conversou com sua tia Simone de Beauvoir, contando a ela o que realmente tinha acontecido, ou seja, contou qe um caro se se aproximou de Yves Michaud, tendo dito que quem teria assassinado seu irmão Yves Michaud era o próprio Jean-Paul Sartre e um amigo dele de nome Albert Camus, que estava dirigindo o caro; Que, o primeiro tiro foi desferido por Jean-Paul Sartre, que atingiu as nádegas de Yves Michaud, ficando o mesmo vivo, quando então o tal Albert Camus pegou a arma e atirou outras vezes contra Yves Michaud; Que também estava no caro um tal de Émile e um dos "gêmeos", Michel ou Gaston; Que, conhecia todos os acima nominados, desde pequenos, pois estudaram juntos e moravam na mesma comunidade; (fl. 206)
Em juízo, Ferdinand Alquié não temeu a presença dos acusados e confirmou toda a ação criminosa que havia presenciado. Reafirmou que estava no dia no local do crime e viu o acusado Jean-Paul Sartre descendo do caro e efetuando os disparos contra seu irmão, disparos estes efetuado pelas costas.
No mesmo sentido ressalta-se a declaração da testemunha Simone de Beauvoir:
Que, naquela noite, muito temeroso de falar alguma coisa, o Ferdinand Alquié acabou dizendo que quem teria assassinado seu irmão Yves Michaud era o próprio Jean-Paul Sartre e um outro de nome Albert Camus, que na época estava dirigindo um caro; Que, Ferdinand Alquié lhe contou que o primeiro tiro foi desferido por Jean-Paul Sartre, que atingiu as nádegas de Yves Michaud, sendo que ele caiu e ficou vivo, quando então o Albert Camus pegou uma arma e dizendo que não deveriam deiar ele vivo, atirou outras vezes contra Yves Michaud; Que Ferdinand Alquié ainda lhe confidenciou que junto no mesmo caro estava um tal de Émile e um dos Gêmeos "Michel" ou "Gaston" [...] Que pelas informações que conseguiu obter de comentários no local, nos dias posteriores, davam conta que o assassinato se dera em razão do tráfico de drogas, pois o Jean-Paul Sartre queria dominar a área aonde ocorreu o assassinato [...] (fl. 81)
Seu depoimento perante o crivo do contraditório seguiu a mesma linha, confirmando a versão acima apresentada. Ressaltou, ainda, que os comentários na região após o crime era uníssono no sentido de apontar os três acusados e os menores Michel e Gaston como os responsáveis pela barbárie.
Cumpra ressaltar que durante a fase do inquérito policial foi realizado pela autoridade policial uma acareação entre os envolvidos na morte de Yves Michaud. Naquela oportunidade tentaram os acusados imputar a inteira responsabilidade pelo crime ao menor Michel Foucault (fls. 171-172)O inimputável assumiu a autoria do fato, afirmando que fez tudo sozinho de moto.
Por sua vez, Émile Durkheim, que anteriormente teria contado todos os detalhes do crime, desde quando entrou no carro até o momento em que os envolvidos fugiram para a cidade de Doutor Pedrinho, se retratou. Durante a acareação afirmou que no dia da morte de Yves Michaud estava na sua casa na companhia de sua mãe, seu pai e sua irmã Rachel.
A própria mãe do acusado Émile Durkheim, no entanto, quando ouvida na delegacia para confirmar a versão de seu filho não deu sustentação a essa falsa declaração, senão a de que Émile Durkheim e os demais acusados estariam, sim, envolvido na morte de Yves Michaud. Assim relatou Marilene dos Reis Ribeiro:Que na noite do assassinato do razpaz conhecido por "zinho" na realidade a declarante estava viajando de sua cidade natal, Lagoa Vermelha-RS, para esta cidade, sendo que chegou no seu bairo no início da manhã, tendo se deslocado para um mercado próximo de sua casa, aonde pretendia comprar alguns mantimentos; Que, naquele, mercadinho, a atendente lhe falou do crime que tinha sido vítima o rapaz de apelido "zinho" e que comentavam que o seu filho Émile Durkheim poderia estar envolvido no caso, em companhia de Jean-Paul Sartre, de dois rapazes gêmeos de nomes Michel e Gaston e de um outro rapaz.; Que, inicialmente foi para casa e não encontrou seu filho Émile Durkheim, tendo então procurado pela mãe do rapaze de nome Jean-Paul Sartre, sendo que ela simplesmente disse: "infelizmente nossos filhos estão envolvidos"; [...] ao conseguir falar com Émile Durkheim, este estava muito apavorado e negava qualquer participação na morte daquele rapaz; [...] depois de dois dias, ele [Émile Durkheim] falou que estava em Doutor Pedrinho-SC, pedindo em desespero que a declarante fosse lhe buscar [...] Que, esclarece que na acareação relizada nesta Delegacia, talvez por ainda sentir medo, seu filho Émile Durkheim tenha inventado que estava em casa em companhia da declarante, do pai e da irmã Rachel, o que não condiz com a realidade [...] (fl. 173-174)
É nítida a intenção infrutífera dos acusados em tentar se esquivar da responsabilização penal que fatalmente será a eles impingida, imputando toda a responsabilidade ao único menor envolvido.
Quando interrogado em juízo, os acusados apresentaram versão inconsistentes e dissociadas de todo o contexto probatório. Émile Durkheim afirmou que estava na rua e chegou Albert e Michel em um carro convidando-o para fazer um lanche. Afirmou que ficou na frente da lanchonete e os dois sairam.
Jean-Paul Sartre, por sua vez, relatou que no dia do crime estava na casa de sua namorada, contrariando a versão narrada pelos próprios acusados na fase policial e da testemunha presencial, que foram enfáticos em afirmar a sua presença no local, sendo inclusive o autor dos disparos."
Ressalta-se que nesta fase processual, de mero juízo de admissibilidade da acusação, impera a orientação do brocardo in dubio pro societate, não se exigindo prova absoluta da culpabilidade do agente, cabendo ao Tribunal do Júri Popular, dentro de sua soberania, conhecer e decidir a matéria (art. 413 do CPP).
Sobre o tema, assim esclareceu o Ministro Marco Aurélio Bellizze:
[& ] A expressão in dubio pro societate não consiste, propriamente, em um princípio do processo penal, mas em eficiente orientação ao magistrado que, ao decidir sobre a pronúncia, deve analisar, de forma fundamentada e limitada, a presença dos elementos mínimos de autoria e materialidade, resguardando o mérito ao juiz natural da causa. [...]
Desta feita, ante a existência dos requisitos previstos no art. 413 do Código de Processo Penal, quais sejam, prova material da ocorrência de crime doloso contra a vida e existência de fortes indícios de autoria, a manutenção da sentença proferida às fls. 441-452 medida que se impõe.
DO REQUERIMENTO
Em face de todo o exposto, o Ministério Público requer o CONHECIMENTO do recurso interposto por Jean-Paul Sartre, uma vez que preenchido os pressupostos de admissibilidade, bem como o seu TOTAL DESPROVIMENTO, mantendo-se a sentença de pronúncia nos exatos termos em que foi exarada, a fim de que seja o recorrente submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri e, ao final, condenado nas penas da lei.
Witmarsum, 13 de março de 2021
Aleister Crowley
Promotor de Justiça
Acusado: Jean-Paul Sartre
Meritíssimo Juiz:
Seguem anexas as contrarrazões de recurso do Ministério Público, em 8 (oito) laudas digitadas. Witmarsum, 09 de dezembro de 2019
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE WITMARSUM
Autos n. 0
Recorrente: Jean-Paul Sartre
Decisão recorrida: Sentença de pronúncia pelo art. 121, §2º, IV, c/c art. 29, ambos do Código Penal
Aleister Crowley
Promotor de Justiça
CONTRARRAZÕES DO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO
COLENDA CÂMARA CRIMINAL
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR RELATOR
EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROCURADOR DE JUSTIÇA
Perante a vara do Tribunal do Júri da Comarca da Capital, o Ministério Público, no exercício de suas atribuições, ofereceu denúncia contra Jean-Paul Sartre e outros dois acusados pela prática do delito tipificado no art. 121, §2º, IV, c/c art. 29 do Código Penal (fls. 2-4). Finda a instrução da primeira fase do rito escalonado dos processos de competência do Tribunal do Júri - o jus accusationis, o MM. Magistrado pronunciou o acusado nos exatos termos da exordial acusatória (fls. 441-452).
Intimado da decisão, o réu Jean-Paul Sartre, por meio de seu defensor, interpôs, tempestivamente, recurso em sentido estrito (fl. 465), cujas razões foram levadas a à efeito às fls. 469-471.
Em seu arrazoado, postulou a defesa a reforma da decisão para absolver sumariamente o recorrente.
Na sequência, vieram os autos para o oferecimento das contrarrazões recursais pelo Ministério Público.
É o relato necessário.
DO MÉRITO
A defesa postulou a decretação da absolvição sumária do recorrente sob o argumento de que Michel Foucault teria assumido o crime e que não há provas da participação do recorrente no fato.
Inicialmente, destaca-se que para a decretação da absolvição pretendida é necessário a prova cabal da ocorrência de uma das hipóteses previstas nos incisos do art. 415 do Código de Processo Penal, caso contrário, o caso deve ser dirimido perante o Tribunal do Júri.
Nesse sentido:
CRIME CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELA SURPRESA E PELO MOTIVO TORPE (ART. 121, § 2.º, INCS. I E IV, DO CÓDIGO PENAL). IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA PRETENDENDO A ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. FASE EM QUE VIGORA O PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. (TJSC. 2011.046596-3. Relator: Alexandre d'Ivanenko. Julgado em: 18/10/2011)
No caso dos autos, denota-se que nenhuma daqueles situações descritas estão demonstradas, tampouco aquela prevista no inciso II como quer fazer crer a defesa.
Isso porque, provada a materialidade do delito, que aliás é inconteste, conclui-se que o fato existiu e constitui uma infração penal. Por outro lado, não há nenhuma causa de isenção de pena ou de exclusão de crime. Por fim, não está provado que o recorrente não é autor ou partícipe do fato, muito pelo contrário, existem fortes indícios de sua participação no delito apurado.
Referendando o entendimento exposto, no que toca a certeza necessária a decretação da absolvição sumária, destaca-se o seguinte julgado deste Egrégio Tribunal.
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. IMPUTAÇÃO DA PRÁTICA DE TENTATIVA DE CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. PRONÚNCIA. INCONFORMISMO INTERPOSTO PELA DEFESA.ALMEJADA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA OU A IMPRONÚNCIA DO ACUSADO. ALEGAÇÃO DE NEGATIVA DE AUTORIA E RETRATAÇÃO JUDICIAL DA VÍTIMA E DAS TESTEMUNHAS OCULARES. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA ACERCA DA INOCÊNCIA DO RECORRENTE. MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA. PREVALÊNCIA DA COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL ASSEGURADA AO TRIBUNAL DO JÚRI. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.(TJSC. 2010.052776-5. Relator: Newton Varella Júnior. Julgado em: 15/03/2011)
A defesa, de forma sucinta, ressalta que há nos autos a confissão do menor Michel Foucault e, em razão, disso não haveria como pronunciar o recorrente pela prática do crime.
No entanto, como já discorrido nas derradeiras alegações apresentadas pelo Ministério Público, essa confissão não merece credibilidade, por contrariar completamente as demais provas produzidas durante a instrução processual.
Nesse sentido, a fim de evitar tautologia, colaciona-se nessa oportunidade a discussão trazida em sede de alegação finais por este Órgão de Execução (fls. 394-397). "A autoria por parte dos acusados Jean-Paul e Émile Durkheim, da mesma forma, é indubitável, possuindo suporte probatório conforme depoimentos colhidos, tanto na fase investigativa quanto na fase processual.
Ainda que durante a acareação realizada pela autoridade policial e durante a instrução processual os acusados tentem dar uma versão diferente dos fatos, impondo a responsabilidade do crime tão somente ao menor Michel Foucault, essa não é a versão encontrada no escólio probatório produzido.
Na primeira oportunidade em que foram ouvidos, os acusados Émile Durkheim (fl. 83-84), Albert Camus (fl. 97-98) e o menor Michel Foucault (fl.123), relataram exatamente como foi a execução do crime. Ainda que existam algumas divergências em suas declarações sobre quem estava dirigindo e sobre quem teria efetuado os disparos, todos foram enfáticos em afirmar que, no momento em que Yves Michaud foi morto, os três acusados estavam no caro e participaram da ação criminosa.
Os três ainda relataram, de forma uníssona, que após a morte de Yves Michaud o grupo (Jean-Paul, Albert, Émile e Michel) se deslocou para a cidade de Doutor Pedrinho, para uma ficar uns dias na casa de familiares do acusado Albert Camus.
Corroborando essa primeira versão apresentada pelos responsáveis, cumpre destacar as declarações lúcidas prestadas por Ferdinand Alquié, irmão da vítima , que presenciou toda a ação criminosa.Nas duas vezes em que foi ouvido na fase policial a testemunha relatou ter visto o acusado Jean-Paul Sartre descer do caro e efetuar os disparos contra seu irmão.
[...] Que dias depois do acontecido, jã mais calmo, conversou com sua tia Simone de Beauvoir, contando a ela o que realmente tinha acontecido, ou seja, contou qe um caro se se aproximou de Yves Michaud, tendo dito que quem teria assassinado seu irmão Yves Michaud era o próprio Jean-Paul Sartre e um amigo dele de nome Albert Camus, que estava dirigindo o caro; Que, o primeiro tiro foi desferido por Jean-Paul Sartre, que atingiu as nádegas de Yves Michaud, ficando o mesmo vivo, quando então o tal Albert Camus pegou a arma e atirou outras vezes contra Yves Michaud; Que também estava no caro um tal de Émile e um dos "gêmeos", Michel ou Gaston; Que, conhecia todos os acima nominados, desde pequenos, pois estudaram juntos e moravam na mesma comunidade; (fl. 206)
Em juízo, Ferdinand Alquié não temeu a presença dos acusados e confirmou toda a ação criminosa que havia presenciado. Reafirmou que estava no dia no local do crime e viu o acusado Jean-Paul Sartre descendo do caro e efetuando os disparos contra seu irmão, disparos estes efetuado pelas costas.
No mesmo sentido ressalta-se a declaração da testemunha Simone de Beauvoir:
Que, naquela noite, muito temeroso de falar alguma coisa, o Ferdinand Alquié acabou dizendo que quem teria assassinado seu irmão Yves Michaud era o próprio Jean-Paul Sartre e um outro de nome Albert Camus, que na época estava dirigindo um caro; Que, Ferdinand Alquié lhe contou que o primeiro tiro foi desferido por Jean-Paul Sartre, que atingiu as nádegas de Yves Michaud, sendo que ele caiu e ficou vivo, quando então o Albert Camus pegou uma arma e dizendo que não deveriam deiar ele vivo, atirou outras vezes contra Yves Michaud; Que Ferdinand Alquié ainda lhe confidenciou que junto no mesmo caro estava um tal de Émile e um dos Gêmeos "Michel" ou "Gaston" [...] Que pelas informações que conseguiu obter de comentários no local, nos dias posteriores, davam conta que o assassinato se dera em razão do tráfico de drogas, pois o Jean-Paul Sartre queria dominar a área aonde ocorreu o assassinato [...] (fl. 81)
Seu depoimento perante o crivo do contraditório seguiu a mesma linha, confirmando a versão acima apresentada. Ressaltou, ainda, que os comentários na região após o crime era uníssono no sentido de apontar os três acusados e os menores Michel e Gaston como os responsáveis pela barbárie.
Cumpra ressaltar que durante a fase do inquérito policial foi realizado pela autoridade policial uma acareação entre os envolvidos na morte de Yves Michaud. Naquela oportunidade tentaram os acusados imputar a inteira responsabilidade pelo crime ao menor Michel Foucault (fls. 171-172)O inimputável assumiu a autoria do fato, afirmando que fez tudo sozinho de moto.
Por sua vez, Émile Durkheim, que anteriormente teria contado todos os detalhes do crime, desde quando entrou no carro até o momento em que os envolvidos fugiram para a cidade de Doutor Pedrinho, se retratou. Durante a acareação afirmou que no dia da morte de Yves Michaud estava na sua casa na companhia de sua mãe, seu pai e sua irmã Rachel.
A própria mãe do acusado Émile Durkheim, no entanto, quando ouvida na delegacia para confirmar a versão de seu filho não deu sustentação a essa falsa declaração, senão a de que Émile Durkheim e os demais acusados estariam, sim, envolvido na morte de Yves Michaud. Assim relatou Marilene dos Reis Ribeiro:Que na noite do assassinato do razpaz conhecido por "zinho" na realidade a declarante estava viajando de sua cidade natal, Lagoa Vermelha-RS, para esta cidade, sendo que chegou no seu bairo no início da manhã, tendo se deslocado para um mercado próximo de sua casa, aonde pretendia comprar alguns mantimentos; Que, naquele, mercadinho, a atendente lhe falou do crime que tinha sido vítima o rapaz de apelido "zinho" e que comentavam que o seu filho Émile Durkheim poderia estar envolvido no caso, em companhia de Jean-Paul Sartre, de dois rapazes gêmeos de nomes Michel e Gaston e de um outro rapaz.; Que, inicialmente foi para casa e não encontrou seu filho Émile Durkheim, tendo então procurado pela mãe do rapaze de nome Jean-Paul Sartre, sendo que ela simplesmente disse: "infelizmente nossos filhos estão envolvidos"; [...] ao conseguir falar com Émile Durkheim, este estava muito apavorado e negava qualquer participação na morte daquele rapaz; [...] depois de dois dias, ele [Émile Durkheim] falou que estava em Doutor Pedrinho-SC, pedindo em desespero que a declarante fosse lhe buscar [...] Que, esclarece que na acareação relizada nesta Delegacia, talvez por ainda sentir medo, seu filho Émile Durkheim tenha inventado que estava em casa em companhia da declarante, do pai e da irmã Rachel, o que não condiz com a realidade [...] (fl. 173-174)
É nítida a intenção infrutífera dos acusados em tentar se esquivar da responsabilização penal que fatalmente será a eles impingida, imputando toda a responsabilidade ao único menor envolvido.
Quando interrogado em juízo, os acusados apresentaram versão inconsistentes e dissociadas de todo o contexto probatório. Émile Durkheim afirmou que estava na rua e chegou Albert e Michel em um carro convidando-o para fazer um lanche. Afirmou que ficou na frente da lanchonete e os dois sairam.
Jean-Paul Sartre, por sua vez, relatou que no dia do crime estava na casa de sua namorada, contrariando a versão narrada pelos próprios acusados na fase policial e da testemunha presencial, que foram enfáticos em afirmar a sua presença no local, sendo inclusive o autor dos disparos."
Ressalta-se que nesta fase processual, de mero juízo de admissibilidade da acusação, impera a orientação do brocardo in dubio pro societate, não se exigindo prova absoluta da culpabilidade do agente, cabendo ao Tribunal do Júri Popular, dentro de sua soberania, conhecer e decidir a matéria (art. 413 do CPP).
Sobre o tema, assim esclareceu o Ministro Marco Aurélio Bellizze:
[& ] A expressão in dubio pro societate não consiste, propriamente, em um princípio do processo penal, mas em eficiente orientação ao magistrado que, ao decidir sobre a pronúncia, deve analisar, de forma fundamentada e limitada, a presença dos elementos mínimos de autoria e materialidade, resguardando o mérito ao juiz natural da causa. [...]
Desta feita, ante a existência dos requisitos previstos no art. 413 do Código de Processo Penal, quais sejam, prova material da ocorrência de crime doloso contra a vida e existência de fortes indícios de autoria, a manutenção da sentença proferida às fls. 441-452 medida que se impõe.
DO REQUERIMENTO
Em face de todo o exposto, o Ministério Público requer o CONHECIMENTO do recurso interposto por Jean-Paul Sartre, uma vez que preenchido os pressupostos de admissibilidade, bem como o seu TOTAL DESPROVIMENTO, mantendo-se a sentença de pronúncia nos exatos termos em que foi exarada, a fim de que seja o recorrente submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri e, ao final, condenado nas penas da lei.
Witmarsum, 13 de março de 2021
Aleister Crowley
Promotor de Justiça